O contraponto no IR sobre dividendos
É recorrente o discurso de que o Brasil é um dos poucos países que não tributa os dividendos e que isto gera distorções na distribuição da carga tributária, desonerando os mais ricos em detrimento dos mais pobres. É um tema na pauta de muitos presidenciáveis.
É uma meia verdade.
Em primeiro lugar, é fato que, com base na Lei nº 9.249, de 1995, os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, deixaram de estar sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, tampouco integrando a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no país ou no exterior.
Também é verdade que muitos países desenvolvidos tributam os dividendos em alíquotas entre 10% e 25%, alguns com alíquotas adicionais, diferentemente do que ocorre no Brasil.
Todavia, a conclusão dos defensores desta aparente “distorção” não é tão simples quanto parece.
Isto porque não se pode deixar de levar em consideração que estes dividendos são o resultado do capital investido pelo acionista. Decorrem do lucro gerado na empresa em que investiu o seu capital. E este mesmo lucro, gerado a partir do investimento feito, também foi submetido à tributação nominal aproximada na empresa, no âmbito do lucro real, de 34%, somando-se as alíquotas de IR e de CSLL.
Logo, a análise deve contemplar a carga em toda a cadeia de tributação deste lucro, antes e depois da sua distribuição aos acionistas.
Ademais, esta alíquota nominal de 34% de IR e CSLL não equivale, no mais das vezes, a uma alíquota real de 34% sobre o acréscimo patrimonial (lucro) gerado na empresa.
Primeiro porque a lei brasileira impede a compensação integral de prejuízos fiscais acumulados em exercícios anteriores, limitando-os a 30% sobre o lucro gerado no exercício.
Se determinada empresa acumulou prejuízos enormes por “n” anos, sofrendo com sucessivas perdas, será tributada ao menor sinal de recuperação, submetendo a maior parte de qualquer pequeno resultado aos 34% de IR e CSLL. Vale dizer, é tributada mesmo acumulando enormes perdas no tempo. É tributada mesmo amargando decréscimo patrimonial.
Segundo porque, desde a Lei nº 9.250, de 1995, foi extinta a correção monetária das demonstrações financeiras. Um dos efeitos daquele instituto era expurgar os efeitos inflacionários dos resultados das empresas, evitando a tributação do que lucro não era. Isso seria ótimo em um ambiente sem inflação, tal como ocorre na maioria dos países escolhidos para comparação. Ocorre que, por menor que seja, a inflação medida pelo IPCA-E, acumulada desde janeiro de 1996, passou a casa dos 450%.
Isto significa que, por exemplo, um ganho de capital na venda de um ativo de uma empresa poderá estar sujeito à alíquota de 34% de IR e CSLL sobre uma perda inflacionária de até 450%. Em outras palavras, o “ganho” da empresa poderá ser injustamente tributado a uma alíquota real de IR e CSLL aproximada de 153% (34% sobre 450%).
Quero dizer que a reforma da tributação sobre dividendos pelo IR não pode desprezar uma revisão geral da tributação sobre os lucros das empresas. As comparações com outros países devem levar em conta toda a sistemática de tributação sobre o lucro das empresas, especialmente o tratamento dos prejuízos pretéritos, a realidade inflacionária, além dos efeitos econômicos e arrecadatórios que se pretende atingir com este redimensionamento da carga tributária.
Por Eduardo Salusse - Bacharel em Direito pela PUC/SP – Especialização em Contabilidade Fiscal pela FGV Direito SP – Mestre em Direito Tributário pela FGV Direito SP – Doutorando em Direito Constitucional e Processual Tributário pela PUC/SP – Sócio fundador do escritório Salusse Marangoni
FONTE: Newsletter COAD
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